Desde o início da segunda temporada de Andor, muitos fãs demonstraram preocupação com o destino de Bix Caleen. Interpretada por Adria Arjona, a personagem passou boa parte da trama sendo constantemente rebaixada a um estado de sofrimento contínuo: traumas, perseguições, quase agressões e um sentimento de impotência crescente. Era como se a série estivesse pavimentando o caminho para um dos clichês mais exaustivos da ficção: a morte da personagem feminina para alimentar o arco emocional do protagonista.
A ausência de Bix no filme Rogue One só aumentava a suspeita. Se ela não aparece ali, será que não está mais viva? A cada episódio, parecia mais certo que a série caminharia para o clichê da “mulher descartável”, o famoso trope do “fridging”, onde a dor ou a morte de uma mulher serve exclusivamente para motivar o protagonista masculino. Felizmente, Tony Gilroy e sua equipe evitaram esse destino previsível.

Imagem: Lucasfilm, Ltd.
A primeira temporada já havia colocado Bix nas mãos do Doutor Gorst, sendo vítima de uma brutal tortura. A segunda focou nas consequências disso. Vemos Bix com traumas profundos, insônia, dependência de drogas para lidar com o medo constante do Império, e numa relação cada vez mais tensa com Cassian Andor. Em diversos momentos, ela parece ser mais um fardo do que uma aliada ativa da rebelião.
Mas tudo muda no episódio 6, “Que noite festiva”. Bix finalmente tem seu momento de virada: confronta o Doutor Gorst, o torturador que a marcou, o submete ao mesmo tipo de tortura que sofreu e ainda explode o local com uma frieza surpreendente. A transformação é clara — ela deixa de ser uma vítima passiva para se tornar agente de sua própria narrativa. Cassian e Bix, então, caminham juntos, agora como iguais.
Infelizmente, esse ápice logo dá lugar a um papel mais secundário. Bix passa a funcionar como apoio ao arco de Cassian, especialmente em sua transição final para líder rebelde. No entanto, mesmo nesse lugar menos central, ela ainda evita a morte — o que já é uma vitória contra a expectativa narrativa mais comum.
Na reta final, acontece algo inesperado: Bix termina a série viva, segura em Mina-Rau, sorrindo para o futuro e segurando o filho de Cassian Andor. Sim, o criador Tony Gilroy confirmou que a criança é deles. Isso reconfigura a narrativa, dando a Cassian um legado literal — um filho que ele nunca conhecerá, mas que representa o futuro pelo qual ele lutou.

Imagem: Lucasfilm Ltd.
É aqui que a série flerta com outro clichê: o do “filho do herói caído”. Ainda que poderoso do ponto de vista simbólico, esse trope pode parecer manipulativo ou superficial se for mal executado. Felizmente, Andor o usa como contraponto direto à fala marcante de Luthen na primeira temporada: “Queimo minha vida por um nascer do sol que nunca verei.” O filho de Cassian é esse nascer do sol.
Andor pode ter tropeçado em alguns momentos com Bix, especialmente ao compará-la a personagens femininas mais complexas da série. Mas ao final, ela sobrevive, se recupera e segue em frente. Isso por si só já é um pequeno triunfo narrativo num universo tão acostumado a sacrificar mulheres para alimentar histórias masculinas.
Em vez de transformá-la em mártir, Andor entrega a Bix uma vitória silenciosa: ela vive. E isso importa.

Imagem: Lucasfilm Ltd.